Você está em qualquer grande cidade do país e vê como todas
elas são afetadas pelos intensos cultos, onde religiosos fundamentalistas
defendem sua fé, discutindo entre as várias linhas teológicas indicadas por
seus ídolos e escudos representativos. Os debates são intensos, nalguns casos,
começam no café da manhã e acabam no jantar. A TV a cabo tem mais de vinte
canais de transmissão deste fenômeno religioso brasileiro. Não há como fugir.
Os mais dedicados a esta religião consumem todos os produtos,
ostentando, cada qual com a cor que representa determinada facção, o que chamam
de manto sagrado.
Nos cultos, entoam cânticos que visam motivar aos sacerdotes
de seu credo. A fé é inabalável.
Não há duvidas, quando a bola rola, na maior religião do
Brasil – falo do futebol, obviamente – os corações são tocados, a emoção fica
ativa e a razão é abandonada.
Esta ideia não é original – alguma coisa é? –, mas uma
adaptação da ideia utilizada no livro Deuses
Americanos, de Neil Gaiman. Nesta obra, utilizando-se do conceito de
mitologia praticado nos povos antigos – em que cada ponto relevante àquela
sociedade vira uma divindade –, Gaiman cria deuses pautados no mundo moderno;
um deles, por exemplo, seria o deus Fama, que não precisa de explicações – ou
será que preciso dizer o quanto é supervalorizado o status de famoso em nossa
época?.
Ao pensar sobre qual seria a crença/ponto de envolvimento emocional do brasileiro, cheguei a
conclusão que nada é mais forte que o futebol – diga-se de passagem que não
estou dando uma opinião, apenas relatando algo que vejo – embora, sinceramente,
há algum tempo que perdi o hábito de todos os finais de semana assistir a jogos
televisionados – e por isso registro –. Nesta perspectiva, chamo a atenção ao
fato de quantos de nós já não termos ouvido dalgum torcedor que “torcer no
estádio é diferente”, “uma coisa boa que todos sentem”; notaram as semelhanças
com o discurso religioso?
Não estou propondo que o futebol vire uma religião, mas sim
que os fiéis – digo, fãs – dos times militam da mesma forma que os religiosos
condenados por eles. O fato é que ninguém para com intuito de refletir na
questão. Os processos são os mesmos de adeptos e torcedores: hinos, cantos,
reuniões, sócio-torcedores/membros, jogos/cultos, entre outros.
O futebol é realmente a religião mais praticada do Brasil,
levando vantagem sobre as outras no quesito de seus fiéis serem muito mais
fanáticos – ainda não vi por aqui grupos de outras religiões organizarem
“brigas organizadas entre si”, já sobre o esporte da bola, não posso dizer o
mesmo.
Enfim, diante de tanto religiosismo, fico tentado a afirmar
que Deus deve ser brasileiro, mas não posso levantar esta hipótese, afinal o
papa é argentino.
Por Vilto Reis.